Opinião: Telespectador ou Telaspectador?

quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Por Paulo Leal (*)

“Nossos comerciais, por favor!”. Era assim, de forma enfática e com um gesto marcante com a mão direita estendida para o alto, que o apresentador Flávio Cavalcanti chamava na década de 70 o intervalo de seu programa, transmitido via Embratel para todo Brasil pela Rede Tupi de Televisão.

Durante os 65 anos da história da TV brasileira, Flávio Cavalcanti foi acompanhado em seus bordões por outros apresentadores memoráveis, como “Vamos faturar, vamos faturar”, de Raul Gil; “roda, roda, roda e avisa, um minuto pro comercial”, do saudoso Chacrinha; ou “é vapt, vupt!”, do professor Raimundo, personagem de Chico Anysio.

Mas a mídia TV como conhecemos não é mais a mesma e atravessa um momento histórico sem precedentes, que não deverá levar as emissoras a desligar seus transmissores, porém certamente conduzirá a uma profunda reformulação no seu modelo de negócios. O fim da era da TV como principal veículo de massa e líder absoluto em audiência é decorrente de dois fatores principais, um técnico e um comportamental.

O primeiro é o fio, que restringe a mobilidade e obriga os assinantes a receberem o sinal via cabo, além da necessidade de dispor de um ponto fixo de energia para ligar o aparelho mesmo que opte pelo satélite. O segundo é a transição do ‘telespectador’ para ‘telaspectador’, multiplicando o número de telas onde assistimos a programação, que deixa de ser produzida exclusivamente pelas grandes redes de TV para abrir espaço para novas empresas de mídia dispostas a disputar a atenção da audiência com conteúdos em vídeo que podem ser visualizados em qualquer tela, a qualquer hora, em qualquer lugar e, o principal, sob demanda. Este é o comportamento da nova geração ‘cord cutters’, nascida depois do surgimento da TV a cabo e que assistem programas de TV e cinema sem precisar de fios.

A explosão do vídeo online já deixou de ser tendência e não há dúvidas de que irá abocanhar uma fatia cada vez maior do bolo publicitário. Assistir TV sempre foi um hábito familiar, que reúne todos na sala em frente ao aparelho para se entreter com a novela ou o programa de auditório, mas, como acontece até hoje, só abre espaço para os anunciantes durante o intervalo comercial, sem necessariamente engajar e muito menos interagir com o público, que, vale lembrar, no caso da TV é muito heterogêneo, com perfis, idades e hábitos de consumo diferentes.

Com a mudança comportamental da audiência, que agora decide o que quer ver, quando, onde e em que tela, os anunciantes precisam abrir os olhos para uma nova realidade no consumo de programação e conteúdos em vídeo. Nos Estados Unidos, 10% dos assinantes de TV a cabo já migraram para assinantes de fibra ótica e acesso wi-fi, enterrando a TV física para dar vez a TV wireless. Não é à toa que temos assistido fusões entre empresas de TV a Cabo com operadoras de telefonia, como na integração da Claro com a NET e a Embratel, e do casamento da AT&T com a Sky.

Aos poucos, mas em velocidade crescente, o Brasil começa a despertar para o novo cenário da TV. De acordo com o Interactive Advertising Bureau (IAB), a publicidade online registrou um movimento de R$ 8,3 bilhões no ano passado e a expectativa é que alcance R$ 9,5 bilhões este ano. O vídeo online representou R$ 811 milhões deste total, ocupando a terceira posição em investimentos dos anunciantes.

Vivemos a era da integração de plataformas de mídia que entregam conteúdos a qualquer hora e em qualquer lugar para uma audiência sempre conectada na Internet. Agora, anunciantes e agências desenham planos de mídia para definir como, quando e onde comprar para alcançar a melhor performance, o que passa obrigatoriamente pelo vídeo online.

A TV como conhecemos não dará mais, sozinha, conta do recado. Ao mesmo tempo que assistimos a um momento crítico e disruptivo para TV, esta é uma oportunidade única para criar novos modelos, produções com excelência e conteúdos em novos formatos que podem ser acessados everywhere e não são acessados pelo controle remoto, mas são sugeridos pelo hábito de consumo de mídia identificado por algoritmos, proporcionando uma experiência mais personalizada e interativa.

Um estudo recentemente divulgado pelo eMarketer confirma que o vídeo online veio para ficar. Entre outras conclusões, a pesquisa indicou que o ‘telaspectador’ passa hoje mais tempo assistindo vídeos do que navegando nas redes sociais – 1h55 min contra 1h44min – e está deixando de ver TV para acessar vídeos digitais, o que está levando importantes redes a embalarem seus programas para pacotes disponibilizados em mídias online ou através de pacotes de assinatura, casos da HBO, CNN, Disney Channel e ESPN.

Outro dado interessante revelado pela mesma pesquisa mostra o que o futuro nos reserva: os ‘milllenials’, com idade entre 14 e 25 anos, são o único grupo que já assiste mais programas em devices digitais do que na TV tradicional. Mas seja qual for a plataforma, o conteúdo e a publicidade continuarão soberanos. Os campeões de audiência da velha TV continuarão gritando seus bordões para chamar os comerciais. E novos apresentadores de canais da TV sem fio vão bradar o mesmo: “nossos comerciais e vamos faturar, por favor!”

(*) Country Manager da Zoomin.TV no Brasil

Crédito: Reprodução / Fotolia



fonte:http://www.meioemensagem.com.br/home/midia/noticias/2015/09/29/Opiniao-Telespectador-ou-Telaspectador.html
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